Até mesmo conservadores brancos africânderes rejeitam a mentira de “genocídio branco” inventada por Trump
- Clandestino
- há 3 dias
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Às vésperas do encontro entre o presidente sul-africano Cyril Ramaphosa e o presidente dos Estados Unidos, em Washington, a atenção internacional se volta para um grupo específico da população sul-africana: os agricultores brancos africânderes, centro de uma nova controvérsia envolvendo pedidos de refúgio nos EUA.
Durante uma feira agrícola realizada em Bothaville, no coração rural da África do Sul, milhares de agricultores – negros e brancos – participaram de exposições que incluíam desde sementes e tratores até armas de fogo. Ao lado do evento, visitantes prestaram homenagens em um memorial às vítimas de ataques em fazendas, tocando os nomes inscritos – tanto de trabalhadores quanto de proprietários rurais assassinados.
Apesar das tensões, até mesmo grupos conservadores presentes contestaram a alegação de “genocídio branco”, desinformação promovida durante o governo Trump que resultou no corte de recursos à África do Sul e no incentivo ao refúgio de agricultores brancos no exterior. Desde então, pelo menos 49 africânderes foram aceitos como refugiados nos Estados Unidos sob alegações de perseguição racial – apesar da falta de evidências concretas que sustentem essas acusações.

"O crime nas áreas rurais atinge tanto agricultores negros quanto brancos. É uma questão de vulnerabilidade, não de raça", explicou Thobani Ntonga, agricultor negro da província do Cabo Oriental, que relatou ter sido vítima de uma tentativa de sequestro em sua propriedade. "As fazendas são isoladas, e os criminosos se aproveitam disso."
O próprio presidente Ramaphosa, também produtor rural, visitou a feira pela primeira vez em duas décadas. "Não devemos fugir de nossos problemas", declarou. "Fugir é covardia."
Segundo o ministro da Agricultura, John Steenhuisen, que integrará a comitiva presidencial nos EUA, o objetivo da visita é apresentar os fatos ao governo norte-americano. “Não há expropriação em massa de terras em curso, tampouco genocídio”, afirmou à Associated Press.
Dados policiais apontam que, em 2024, ocorreram 12 assassinatos em áreas rurais sul-africanas: apenas um envolvia o proprietário da fazenda; as demais vítimas eram trabalhadores e seguranças. As estatísticas não especificam a raça dos mortos. De forma mais ampla, a África do Sul registrou quase 7 mil homicídios em 2024, a maioria envolvendo vítimas negras e pobres.
A disparidade na posse de terras, no entanto, permanece um ponto de tensão. Segundo o censo agrícola de 2017, 80% das terras agrícolas comerciais são de propriedade de brancos – que representam apenas 7% da população. Já a auditoria de terras daquele mesmo ano apontava que 72% das propriedades registradas individualmente pertenciam a sul-africanos brancos, enquanto negros detinham apenas 15%. O Banco Mundial classifica a África do Sul como o país mais desigual do mundo.

A concessão de refúgio a africânderes reacende o debate sobre critérios e privilégios no sistema de asilo dos EUA. Katia Beeden, integrante de um grupo de apoio a sul-africanos brancos, explicou que o processo de solicitação exige múltiplas entrevistas e provas de perseguição. “É rigoroso, e nem todos conseguem. Mas é uma via que tem sido explorada por quem alega insegurança.”
Enquanto isso, agricultores como Willem de Chavonnes Vrugt questionam a viabilidade do êxodo: “Estamos aqui há gerações. Por que deixaríamos nossa terra?”
A visita de Ramaphosa aos Estados Unidos ocorre sob esse pano de fundo: uma tentativa de esclarecer a realidade no campo sul-africano e rebater as mentiras que alimentam o medo, a desinformação e, possivelmente, interesses políticos internacionais.
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