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De rolê em Ancara com Ataturk para rir da “porra da rainha”

Tenho muita coisa para contar sobre ontem, mas, francamente, o dia foi um borrão de entorpecentes  - prescritos por um cara que encontrei na esquina - que precisei tomar para aguentar a maratona: doze horas de voo, mais quatro de escala, mais quatro voando, mais seis esperando o metrô de Istambul começar a funcionar, e ainda mais cinco circulando pela cidade até conseguir embarcar no trem para Ancara. O saldo? Poucas memórias e uma única glória: chamar a porra da rainha Lilibeth de… porra! Mas enfim, melhor começar pelo dia de hoje.


Acordamos no hotel e tomamos um café que, sem exagero, foi a redenção dos esfomeados. A melhor coisa sobre o café da manhã na Turquia é a variedade de azeitonas: pretas, verdes, roxas, amarelinhas… Um arco-íris oleoso ao lado de queijos de todos os tipos e texturas. Após essa pequena indulgência gastronômica – necessária, diga-se de passagem, já que há dois dias não fazíamos uma refeição decente – saímos para explorar a capital turca. E, sim, Ancara é a capital, não Istambul, como muitos acreditam. A confusão é compreensível; até a revolução nacionalista liderada por Mustafa Kemal Atatürk, Istambul reinava como o centro do poder. Foi só após as reformas de Atatürk que Ancara tomou o posto.



E já que falamos nele, é impossível caminhar por Ancara – ou por qualquer canto da Turquia, na verdade – sem topar com imagens, bustos, bandeiras e homenagens a Atatürk. Mas quem foi esse homem que, até hoje, molda o orgulho nacional? Sua importância vai além de ser o fundador da República da Turquia ou seu primeiro presidente. Ele não só liderou a independência do país como desenhou, com mãos firmes, o que seria a Turquia moderna: secular, autônoma e com um pé fincado na modernidade, enquanto o outro chutava o colonialismo europeu.


Após a derrota do Império Otomano na Primeira Guerra Mundial, a Turquia estava à beira de ser picotada em zonas de influência estrangeira, como aconteceu com o Líbano, a Palestina, a Síria, Iraque e outros. Sob a liderança de Atatürk, no entanto, o país resistiu. Ele liderou a Guerra de Independência (1919-1923), culminando na assinatura do Tratado de Lausanne, que garantiu a soberania turca. Em 1923, proclamou a república, arrancando de vez o país do jugo otomano. Sem ele, não seria absurdo imaginar a Turquia hoje lutando na ONU por reconhecimento estatal ou, pior, sendo palco de bombardeios patrocinados por alguma potência ocidental.


Observação: Para os PhDs de plantão, não se preocupem: falarei também sobre os crimes cometidos neste período, mas no momento adequado.


Mas quais foram as principais reformas promovidas por Ataturk?


Atatürk separou religião e estado com precisão, abolindo o califado e instaurando um sistema jurídico baseado na razão, porém, sem ignorar a força da fé; Na educação, transformou o sistema educacional, tornando-o laico, universal e acessível a toda população; Na economia e infraestrutura priorizou a industrialização e o desenvolvimento de uma economia independente, rompendo com a dependência do antigo regime otomano; E nos Direitos das Mulheres, Atatürk garantiu às mulheres o direito ao voto e incentivou sua participação política e social, muito antes do país da “porra da rainha”. Ah, vale lembrar que Chirchill foi o principal opositor do sufrágio universal no Reino Unido.


Essas reformas não só consolidaram a Turquia como um estado-nação moderno, mas também fizeram de Atatürk um símbolo unificador para os turcos. Ele encarna a independência, a soberania e a recusa em se submeter a modelos estrangeiros. Internacionalmente, é reverenciado como um líder reformista, que equilibrou tradição e modernidade com uma audácia difícil de igualar.


E se ainda restava alguma dúvida sobre a relevância dele, basta lembrar que Atatürk deu não uma, mas duas surras históricas em Winston Churchill e seus capangas do Ocidente e, tudo isso sem pedir desculpas à porra da rainha.


Foi por isso que, no nosso primeiro dia em Ancara, dedicamos nosso tempo para prestar homenagem a esse homem que, com todas as contradições de sua trajetória, reinventou uma nação. Se o café turco nos deu energia, foi Atatürk quem nos deu o propósito. E a história só está começando.

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