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1º de maio... O desabafo de um policial


Foto de arquivo. Não corresponde ao autor do texto
Foto de arquivo. Não corresponde ao autor do texto

Dia do Trabalhador... e ontem, no meu trabalho na área de segurança pública, perdemos dois trabalhadores policiais de forma brutal. Sim, dois trabalhadores. Porque é assim que temos de ser vistos pela elite política brasileira tanto da ala direita quanto da ala esquerda - essas duas vertentes ideológicas toscas quando o assunto é enxergar a imagem do policial no Brasil.


Sempre fomos vistos como "capangas" e "assassinos" pela esquerda ou como "heróis" e "guerreiros" pela direita. Cada lado promovendo o mesmo perfil de ser inumano ou sobre-humano que não somos, mas que serve para seus interesses escusos de política populista e inócua que não contribui para a mudança de quadro da guerra urbana e promoção de direitos humanos destes trabalhadores.


Tanto para um lado como para outro, não devemos possuir direitos: não podemos falar, não temos direito à greve, à liberdade de expressão; a sermos reconhecidos como somos: pais, filhos, mães, filhas, maridos, esposas e seres humanos que prestam um trabalho elencado na Constituição Federal como essencial e um direito do povo, o de ter segurança.


Quem me conhece sabe a postura que desenvolvi por estes mais de 10 anos como policial. Nunca deixei ninguém: nem a instituição e nem a sociedade dizer que não tenho direitos. E assim fui achincalhado pela direita por ser um policial que defende os direitos, principalmente os direitos dos policiais. Igualmente fui achincalhado e apontado como "infiltrado" pela esquerda também por ser um policial, um inimigo que se 'esconde' na capa de um poeta e escritor ativista. Não passo de um impostor para os dois lados, porque para eles ser policial não é nada disso. Não entro no estereótipo, no perfil acrítico e robótico que criaram para alguns desavisados se "disciplinarem". Sofro assim um estigma, porque ouso me pronunciar e desconstruir este mal entendido tão propalado pelo discurso político raso e inócuo.


Ontem perdi dois colegas de farda: um se suicidou já na idade de reforma, a imagem de um senhor sem vida que se auto-exterminou foi espalhada nas redes; o outro foi covardemente assassinado com 35 anos, enquanto lutava por sua vida, deixando uma esposa e dois filhos que aguardavam seu retorno. Tanto um como o outro são seres humanos e por serem humanos transporam o portal da vida para este acontecimento que confirma que somos, de fato, apenas sombra e pó: a morte.


Não somos heróis, não somos guerreiros, nem infiltrados ou impostores. Somos trabalhadores! Somos como todos os outros trabalhadores com uma única ressalva: temos de ficar em silêncio sobre nossas promoções que não chegam, sobre nosso salário defasado, sobre as escalas extenuantes que nos sobrecarregam, sobre nosso sofrimento físico e mental, enfim, sobre todos os nossos direitos civis não-reconhecidos e que são o cerne do nosso adoecimento e tragédia.


Neste Dia do Trabalhador lembro de todos os trabalhadores da segurança pública que morreram assassinados e que tiraram suas vidas; lembro de todos os que não suportaram mais o silêncio imposto como resquício dos tempos de exceção e que uma certa Constituição "cidadã" capitulou em perpetuar como símbolo sobre seus desafetos: contra os trabalhadores oriundos das classes desfavorecidas e que assim, silenciados, teriam a outorga de silenciar também outros trabalhadores que não aceitam o conivente silêncio...



A todos os trabalhadores do Brasil, um Feliz Dia do Trabalhador!


A todos os policiais do Brasil e a todos os meus colegas de ontem e de hoje que morreram e que arriscam suas vidas, Um Respeitoso Silêncio!



𝗝𝗲𝗮𝗻𝗱𝗲𝗿𝘀𝗼𝗻 𝗠𝗮𝗳𝗿𝗮

Mestre em Letras pela UFMA. Escritor e Poeta. Policial militar do Estado do Maranhão e Professor da SEMED - São Luís (MA). Autor do livro "Discurso e Violência: as implicações das relações de poder nas instituições de Segurança Pública do Maranhão" e "Ode Ao Rito Primevo".

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