Da guerra da Argélia à Palestina: continuidade colonial e institucionalização da tortura
- Mohammed Hadjab

- 12 de out.
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O uso sistemático da tortura pela França durante a guerra da Argélia (1954–1962) e por Israel nos territórios palestinos ocupados revela a permanência da violência colonial nos dispositivos estatais modernos. Em ambos os contextos, a tortura não é um desvio individual, mas uma prática de Estado, inserida em uma lógica de dominação, controle e desumanização das populações autóctones.
Na Argélia, a Batalha de Argel (1957) marca a generalização da tortura como ferramenta de contra-insurreição. Sob o comando dos generais Jacques Massu e Marcel Bigeard, o exército francês instaurou um sistema de prisões arbitrárias, interrogatórios e desaparecimentos forçados. O objetivo declarado era “desmantelar a rede terrorista”, mas a finalidade real era a submissão psicológica do povo colonizado. Pierre Vidal-Naquet, em La torture dans la République (1972), demonstrou que essa violência, longe de ser excepcional, fazia parte de uma política institucional sustentada pelo Estado francês. Frantz Fanon, psiquiatra no hospital de Blida-Joinville, analisou os efeitos dessa prática em Os Condenados da Terra (1961): a tortura é a forma extrema de comunicação entre o colono e o colonizado, uma relação de poder absoluto sobre o corpo e o espírito.
Esses dispositivos coloniais encontram eco nas práticas israelenses em relação aos palestinos desde 1948, e de forma ainda mais intensa desde 1967. Relatórios de organizações como a Anistia Internacional, a Human Rights Watch e o Comitê da ONU contra a Tortura documentam o uso sistemático da tortura física e psicológica: posições de estresse, privação de sono, violência sexual, ameaças contra familiares e isolamento prolongado. Essas práticas são justificadas, assim como na Argélia, em nome da “segurança nacional” e do “combate ao terrorismo”.

Vários historiadores, como Raphaëlle Branche e Sylvain Laurens, destacaram a transmissão direta dos saberes militares franceses a Israel, sobretudo por meio da cooperação francoisraelense nas décadas de 1950 e 1960. As doutrinas francesas da “guerra revolucionária” — elaboradas na Indochina e aperfeiçoadas na Argélia — inspiraram as práticas israelenses de controle territorial, inteligência militar e domínio sobre populações civis.
A tortura, portanto, constitui um elemento estrutural dos regimes de dominação colonial: uma “pedagogia do terror” destinada a produzir docilidade pela dor. Da Argélia colonial à Palestina ocupada, o corpo do Outro se torna o espaço onde se inscreve a soberania do colonizador. Como observa Achille Mbembe em Políticas da Inimizade (2016), essas práticas revelam a necropolítica, ou seja, o poder de decidir quem pode viver e quem deve morrer.


























































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