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Escravidão Moderna: O Legado Oculto das Mudanças Climáticas na África

Os desastres climáticos, cada vez mais frequentes e intensos, estão transformando sociedades ao redor do mundo. No entanto, um aspecto pouco explorado dessa crise é como os eventos climáticos extremos estão criando condições propícias para o aumento da escravidão moderna. O jurista Daniel Ogunniyi, especialista no tema, analisa a complexa relação entre mudanças climáticas e escravidão moderna na África, destacando os desafios e as soluções necessárias para combater esse problema crescente.



Um jovem não identificado em pé perto de um poço em uma mina de cobalto na mina Ruashi, a cerca de 20 quilômetros de Lubumbashi, Congo, RDC. Per-Anders Pettersson Getty Images
Um jovem não identificado em pé perto de um poço em uma mina de cobalto na mina Ruashi, a cerca de 20 quilômetros de Lubumbashi, Congo, RDC. Per-Anders Pettersson Getty Images


O que é escravidão moderna e qual sua dimensão na África?


A escravidão moderna não é um conceito legalmente definido, mas abrange práticas como trabalho forçado, tráfico humano, servidão e casamentos forçados. Diferente da escravidão histórica, ela não se limita a correntes físicas, mas se sustenta por meio de controle, coerção e exploração. Na África, práticas como a escravidão baseada na descendência — onde pessoas nascem em condições de servidão devido ao status de seus ancestrais — ainda persistem em países como Chade, Mali, Mauritânia, Níger e Sudão.


Segundo a Organização Internacional do Trabalho (OIT), cerca de 50 milhões de pessoas em todo o mundo estão presas em formas de escravidão moderna, sendo 7 milhões delas na África. Países como Eritreia, Mauritânia e Sudão do Sul têm índices alarmantes, enquanto Maurício, Lesoto e Botsuana apresentam as taxas mais baixas. Na África, estima-se que 3,8 milhões de pessoas sejam submetidas ao trabalho forçado, especialmente em setores como agricultura, pesca, mineração e serviços domésticos. Além disso, aproximadamente 3,2 milhões de pessoas estão em casamentos forçados.


Traficantes se aproveitam das vulnerabilidades econômicas, oferecendo falsas promessas de emprego. Muitas vítimas acabam exploradas sexualmente ou submetidas a longas jornadas de trabalho sem perspectivas de melhoria. A pobreza, os conflitos armados e a instabilidade política são fatores históricos que alimentam a escravidão moderna. Agora, as mudanças climáticas emergem como um novo e poderoso catalisador.



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Como as mudanças climáticas estão impulsionando a escravidão moderna?


As mudanças climáticas exacerbam desigualdades e vulnerabilidades pré-existentes, criando um terreno fértil para a exploração. Eventos extremos, como inundações, secas, incêndios florestais e o aumento do nível do mar, destroem meios de subsistência, deslocam populações e aumentam a pobreza. Essas condições tornam as pessoas mais suscetíveis a práticas de escravidão moderna.


Grupos extremistas e redes criminosas têm se aproveitado dessas vulnerabilidades. Por exemplo, organizações como o Boko Haram e o Al-Shabaab exploram vítimas em operações de combate ou as mantêm em escravidão sexual. Além disso, famílias afetadas por crises climáticas muitas vezes recorrem a casamentos forçados de suas filhas em troca de dotes, como forma de aliviar a pressão econômica.


Em Gana, secas prolongadas têm levado à migração em massa do norte para o sul do país, onde muitas mulheres e meninas acabam exploradas como kayayie (carregadoras) ou em outras formas de trabalho forçado. Crianças são vendidas a agentes de trabalho, que as submetem a condições desumanas. Esses exemplos ilustram como as mudanças climáticas estão diretamente ligadas ao aumento da escravidão moderna.


O que pode ser feito para combater a escravidão moderna na África?


Fortalecimento Legal: Os governos africanos precisam adotar e aplicar leis robustas alinhadas a padrões internacionais, como a Convenção sobre Trabalho Forçado da OIT (1930) e o Protocolo de Palermo (2000), que criminalizam o tráfico humano e protegem as vítimas.


Cooperação Regional e Internacional: A escravidão moderna muitas vezes atravessa fronteiras, exigindo colaboração entre países para compartilhamento de inteligência e apoio técnico.


Educação e Conscientização: Campanhas de conscientização e programas educacionais são essenciais para informar grupos vulneráveis sobre os riscos da escravidão moderna.


Combate à Pobreza e Desigualdade: Como a pobreza é um dos principais fatores que sustentam a escravidão moderna, políticas de redução da desigualdade e melhoria das condições socioeconômicas são fundamentais.


Integração de Políticas Climáticas e Antiescravistas: As respostas às mudanças climáticas devem incluir medidas específicas para combater a escravidão moderna, indo além da mitigação e adaptação ambiental.


Responsabilidade Corporativa: Empresas do setor de energia renovável devem realizar auditorias de direitos humanos em suas operações e cadeias de suprimentos para evitar a exploração durante a transição para energias limpas.



Um jovem pescando no Rio Congo (RD Congo), perto de Isangi. Foto OCHA Wassy Kambale.
Um jovem pescando no Rio Congo (RD Congo), perto de Isangi. Foto OCHA Wassy Kambale

A escravidão moderna é uma realidade sombria que se agrava com os impactos das mudanças climáticas. Na África, onde milhões já enfrentam os efeitos de secas, inundações e conflitos, a luta contra a exploração exige uma abordagem multifacetada. Combater esse problema requer não apenas leis e políticas eficazes, mas também uma mudança na forma como as mudanças climáticas são abordadas, garantindo que a transição para um futuro sustentável não deixe ninguém para trás.


Este artigo é uma adaptação do texto de Daniel Ogunniyi, Professor de Direito na Universidade de Hull, originalmente publicado em The Conversation. Você pode acessá-lo pelo seguinte link: https://theconversation.com/modern-slavery-and-climate-change-how-extreme-weather-fuels-forced-labour-and-unwanted-marriages-247469

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