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As pessoas que comemoram sua vitória dizem muito sobre a pessoa que você é

Hoje, logo quando vi o vídeo da comemoração da vitória de Zohran Mamdani para prefeito de Nova York, algo muito ímpar me chamou a atenção. As pessoas que estavam presentes na festa, pela primeira vez na história, se pareciam comigo — mesmo que eu esteja no Brasil. O que estou dizendo é representatividade. Naquela comemoração havia pessoas da comunidade negra, da comunidade muçulmana e imigrantes dos mais diversos cantos do mundo. Havia rostos cansados, mas cheios de esperança — a esperança de quem carrega cicatrizes, mas ainda encontra força para sorrir e acreditar que o amanhã pode, enfim, ser nosso. Havia mulheres de hijab, jovens latinos, homens com sotaques diversos, bandeiras coloridas, danças espontâneas e abraços sinceros.


Zohran Mamdani
Zohran Mamdani

A vitória de Zohran Mamdani não foi apenas uma vitória eleitoral. Foi o grito coletivo de uma Nova York que, por décadas, foi sufocada por elites brancas, bilionárias e corporativas que ditavam o rumo da cidade mais plural do planeta. Mamdani representa uma ruptura, uma inversão de lógica trumpista que tem assombrado os Estados Unidos — essa mesma lógica que alimenta o ódio ao imigrante, o medo do diferente e a nostalgia do poder branco. E agora, ironicamente, é um homem de origem africana e sul-asiática, muçulmano, socialista e filho de imigrantes que ocupa o cargo político mais importante da capital simbólica do capitalismo mundial. É o tipo de ironia que faz a elite branca perder o sono — e bem que merece noites insones.


O vídeo da comemoração mostra algo que raramente vemos em campanhas políticas — a alegria do povo comum. Não havia glamour, não havia verniz institucional, não havia a frieza dos auditórios empresariais e nem saudações nazistas – como estamos acostumados a ver quando se trata de eleição nos EUA. O que se via era o calor humano de quem sentia que aquela vitória também era sua. A energia era de rua, de bairro, de comunidade — algo que só quem vive a margem entende. Era como se Harlem, Jackson Heights, Brooklyn e o Bronx tivessem se encontrado num mesmo espaço para celebrar uma justiça simbólica. A mesma justiça pela qual lutaram Frederick Douglass, Malcolm X, Martin Luther King Jr., Angela Davis e os Panteras Negras; e, mais tarde, líderes como Ilhan Omar, Rashida Tlaib e tantos outros que deram voz aos imigrantes, aos muçulmanos e aos que sempre foram silenciados.


Entre os cânticos e os abraços, era possível perceber algo mais profundo: a noção de pertencimento. Pela primeira vez, muitos nova-iorquinos — e imigrantes que sempre viveram à margem — viam um líder que falava sua língua, compartilhava suas dores e enxergava sua existência para além das estatísticas e dos discursos de inclusão vazia.


A imagem de Mamdani, com o punho erguido e os olhos marejados, cercado por mulheres negras, árabes, sul-asiáticas e latinas, diz mais do que qualquer slogan de campanha. É o retrato de uma Nova York que não cabe mais no molde do império, que exige ser ouvida, respeitada e representada. Histórico, inédito, espetacular — essas são as novas palavras que a elite de Nova York vai precisar se acostumar a ouvir, mesmo que à contragosto.


E é impossível não pensar no contraste histórico. Por décadas, os salões do poder em Nova York foram ocupados por homens brancos, empresários e banqueiros — os mesmos que transformaram a cidade em vitrine do neoliberalismo global. Ontem, porém, o centro do poder político foi devolvido, simbolicamente, àqueles que constroem a cidade todos os dias: entregadores, faxineiras, imigrantes, trabalhadores informais, estudantes e artistas.


Essa vitória carrega uma mensagem global. Em tempos de muros, guerras e discursos de ódio, o triunfo de um muçulmano, filho de imigrantes africanos e asiáticos, na capital simbólica do Ocidente, é um recado claro: o futuro não pertence mais aos impérios, mas às margens que se organizam. E sim, podemos nos perguntar se Mamdani é realmente a “última bolacha do pacote”, se cumprirá o que promete, se manterá sua coerência. Quanto a isso, não sei — só o tempo dirá. Mas quero confiar que sim. E mesmo que não, a mensagem dessa vitória permanece viva: ela me lembra um certo pernambucano que virou presidente, mostrando ao povo que sim, é possível chegar ao poder, é possível ser representado e é possível o povo se autoeleger.


O que se celebrou em Nova York não foi apenas uma eleição, mas a reconfiguração do que significa poder. Um poder que agora fala com sotaque, reza em várias direções e carrega a memória dos que foram colonizados.


Pela primeira vez na história de Nova York, a comemoração não tinha belicistas, racistas ou magnatas brancos. Havia o povo — o verdadeiro construtor da cidade, aquele que faz dela a capital de um mundo multipolar, multirreligioso e multicolorido.


Parabéns Mamdani e parabéns NYC!



 
 
 

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